As famosas “bets” geraram um fenômeno transformador em nossa sociedade. Deixando de lado qualquer julgamento crítico sobre tal mudança, a bem da verdade é que referidas casas de apostas, tamanho o seu poderio econômico e político, trouxeram à luz temas até então adormecidas em nosso país. O que até pouco tempo atrás constituía um “assunto-tabu”, reverteu-se em absoluta normalidade, diante de uma avalanche de casas de apostas que inundaram o cotidiano brasileiro.
Após anos de espera, a Lei 14.790, que regula a modalidade lotérica de apostas de quota fixa, promoveu finalmente um marco legal sobre o tema. A partir de 2025, as empresas do setor que desejarem operar de forma legítima no país, para além da aquisição de licença própria, terão que se submeter a uma série de obrigações aptas a prevenir a prática de lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo, etc.
Acontece que referida legislação veio desacompanhada de qualquer alteração no plano criminal. Desde 1941, a exploração de jogo de azar constitui contravenção penal, punível com prisão simples de 3 meses a 1 ano. Embora em vigor há tanto tempo, por um sem-número de motivos, são raríssimos os casos de persecução penal de combate às casas clandestinas de jogos.
Com a entrada em vigor da nova legislação, que coloca na legalidade casas de apostas que atuam sob a modalidade de quota-fixa, parece imperioso que se estabeleça também um plano legislativo criminal condizente. A se manter a realidade atual, muitas casas de aposta continuarão operando na ilegalidade, dado que a repressão referente à contravenção não terá qualquer efeito inibitório.
Atualmente, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei 2.234/22, que tipifica como crime a exploração de casas de jogos e apostas, em desacordo com a legislação em vigor. É verdade que criação de novos tipos penas, no mais das vezes, afigura-se como medida contraproducente no combate à atividade criminosa. No entanto, em se tratando de ambiente com tamanha permeabilidade a atos de lavagem de capitais e blindagem de condutas ilícitas, o Direito Penal não pode conferir espaço indevido a quem se aproveita da clandestinidade.