Crimes de ódio e justiça consensual

O Direito Penal pátrio tem importado do sistema jurídico anglo-saxão métodos de resolução de casos pela via consensual. Mesmo criticando-se esse movimento, fato é que ele veio para ficar, e o operador do direito deve estar preparado para aproveitar os benefícios que ele pode trazer à aplicação do direito.

Pensando na hipótese de crimes de ódio (injúria racial e racismo), dentre uma gama bastante heterogênea de tipos penais que podem ser submetidos a essa abordagem, a dúvida que fica é: para além do princípio norteador da economia processual, será que o caminho do acordo (em comparação à aplicação de pena) pode ser mais adequado para proteger a sociedade do preconceito corolário da perseguição histórica de minorias?

Em contextos de incompreensão sobre o papel que pequenas ofensas têm na estrutura discriminatória da sociedade, a implementação de uma estratégia conciliadora pode ser mais interessante. Esse é o caso do modelo preconizado pelo I Simpósio Brasileiro de Justiça Restaurativa. A ideia é que, “muito mais que culpabilização, punição e retaliações do passado, passemos a nos preocupar com a restauração das relações Pessoais”, nos termos da Carta de Araçatuba de 2005 (cita-se também a Res. 225/CNJ).

Nestes casos, a imposição de pena talvez seja o golpe decisivo ao tecido social que começou a ser rompido pela ofensa. Afinal, sem entender sua participação na estrutura da discriminação, haverá apenas angústia de sentir-se injustiçado ou injustiçada pela obrigação de cumprir uma prestação de serviços à comunidade, ou por ser preso. Pode aprofundar o preconceito.

Já a voluntariedade e o diálogo estimulam a compreensão mútua e engajam responsabilidade com o futuro de não mais contribuir com essa arquitetura de ódio. Ou seja, protege melhor a sociedade. A justiça restaurativa, evidente, pauta-se em profunda conscientização das partes, principalmente dos agressores ao compreenderem a função que exercem no combate ao racismo pela posição de privilégio que ocupam. Não é algo pensado para agressões alicerçadas em ideias de supremacismo racial, e nem para ser mais simples e mais brando – e sim mais sofisticado e efetivo.