Desafios da Operação Penalidade Máxima no combate às fraudes em jogos de futebol

A operação Penalidade Máxima, que investiga possíveis fraudes ocorridas em jogos de futebol e motivadas por apostas, tem suscitado forte cobertura pela mídia, em boa medida pela lembrança do último grande escândalo criminal envolvendo o futebol brasileiro:  a Máfia do Apito. Naquela ocasião, a interferência em sites de apostas veio pela participação de árbitros, mas a ação penal acabou sendo trancada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, tendo em vista a falta de tipo penal específico. A repercussão desse resultado desencadeou uma série de pressões da sociedade, culminando na alteração do Estatuto do Torcedor (Lei n. 10.671, 2003) em 2015, que trouxe a atual redação dos artigos 41-C e 41-D, base para a operação policial em comento.

Como todo tipo penal editado para resolver problemas concretos específicos, eles trouxeram diversos entraves. Em primeiro lugar, a desproporcionalidade interna do próprio diploma é manifesta, uma vez que a manipulação de competição esportiva mediante promessa de pagamento comina pena idêntica a quem a pratica sem promessa ou solicitação de vantagem econômica (art. 41-E). Além disso, apesar de os casos objeto da Operação Penalidade Máxima trazerem em alguma medida prejuízo às plataformas de apostas, o delito não o exige para sua configuração. Apesar disso, tem pena entre 2 (dois) e 6 (seis) anos, enquanto o estelionato (art. 171, do Código Penal) – também praticado mediante fraude e que necessariamente causa danos a outrem -, possui pena entre 01 (um) e 05 (cinco) anos. Por fim, a expressão “alterar” ou “falsear” evento associado a competição esportiva é de uma obscuridade que torna bastante questionável sua capacidade de delimitar o sentido e alcance do tipo. Assim, enquadrar o ato de levar cartão amarelo propositadamente não escapa a esse desafio de subsunção do fato à norma.

Essa desproporcionalidade jurídico-criminal multiplica-se pelo tratamento a que diversos atletas estão sendo submetidos, como é o caso da decisão tomada pelos clubes de afastar jogadores como Vitor Mendes (Fluminense), Max Alves (Colorado Rapids), Pedrinho e Bryan Garcia (Athletico-PR), Richard (Cruzeiro), Raphael Rodrigues (Avaí), Nino Paraíba (América-MG), Alef Manga e Jesus Trindade (Coritiba) por terem sido citados na investigação. Na Inglaterra, o caso de Kieran Trippier, que também envolveu manipulação de apostas – embora relacionadas à sua transferência do Tottenham para o Atlético de Madrid e não a eventos da partida em si –, cuja sanção se resumiu a suspensão de dez jogos e pagamento de setenta mil libras, incita uma reflexão pela diferença de rigor com que o tema é aqui enfrentado. O futebol brasileiro é patrimônio nacional, e sua exploração compreensivelmente mexe com a consciência coletiva. No entanto, há de se ponderar as mazelas causadas pelo acionamento do aparelho repressivo estatal, especialmente quando alicerçado em tipos penais tão fragilmente redigidos e que irradiam efeitos para além da seara criminal. Tudo isso causa tumulto, desequilíbrio e insegurança jurídica.